Kogos e sua camiseta maçônica. Precisa dizer mais? |
Recentemente
o programa Fantástico da Rede Globo trouxe uma matéria sobre
“empreendedorismo” onde exalta o fato de pessoas estarem se
virando para sobreviver inventando formas de vender serviços e
produtos usando plataformas cibernéticas ligadas as redes sociais e
aos apps. A impressão passada pela referida matéria é que novos
nichos de mercado estão nascendo e que isso traz ganhos de
produtividade ao país em meio a recessão que vivemos – o Brasil
cresceu pífios 1% em 2019! Quem embarcou nessa canoa furada foi o
Ancap Paulo Kogos que se jacta de entendedor de economia.
Kogos
lançou invectivas contra Felipe Neto, no vídeo que listamos aqui:
https://www.youtube.com/watchv=n6uIpQwX7jE&lc=z23dtfbjhzjwj34pj04t1aokg5ksy0solyyklxqfrkh1rk0h00410
que teria criticado a matéria do Fantástico.
No
dizer de Kogos, Neto estaria a desestimular as altas possibilidades
produtivas abertas por plataformas como UBER EATS, IFOOD, RAPPI, etc.
Segundo Kogos haveria altas vantagens para o pólo do capital
representado pelas plataformas referidas quanto para o indivíduo que
se emprega nessas atividades. Kogos reitera que a CLT trava a
produção no país impedindo o emprego de pessoas cuja produtividade
fica abaixo daquela requerida pela lei – que exige um
salário-mínimo a ser pago ao funcionário. A falácia kogosiana é
clara: por um lado ele exulta com as possibilidades produtivas
abertas pelos serviços de apps, depois reconhece que a produtividade
deste tipo de trabalho está abaixo do salário-mínimo o que prova
que seu discurso está a serviço do grande capital e sua sanha por
redução brutal de custos ao mesmo tempo que ele critica os
monopólios numa clara expressão de dissonância cognitiva. O que
Kogos e os jornalistas do Fantástico não entendem é que a
produtividade nesse setor é definida não apenas pela demanda do que
é entregue mas também pela oferta dos entregadores, para ficarmos
só no exemplo dos serviços de entrega. O quadro nesse setor é de
alta elasticidade nos preços pagos pela entrega. Se, por algum
motivo, as pessoas param de comprar comida fora, isso vai afetar
diretamente a margem de ganho de cada entregador. A curva de demanda
aí é muito sensível a qualquer mudança nas condições gerais da
economia – inflação de alimentos podem levar as pessoas a
preferir cozinhar em casa que comprar lanches prontos por conta da
elevação do preço. Mas se a demanda por entrega aumentar e o
número de entregadores for pequena a tendência é que o recebido
por entrega feita aumente em termos não só nominais mais reais.
Esses elementos são os que determinam o ganho num setor onde
prevalece o mecanismo da competição perfeita – a presença de
muitos concorrentes incapazes de dominar amplas faixas do mercado e
fadados a dividi-lo – o que leva todos a buscar reduzir custos,
única forma de angariar maiores lucros num mercado onde a margem de
lucro não pode ser aumentada via hegemonia. Se houver uma mudança
institucional de redução de custos via uma reforma trabalhista como
a que tivemos na era Temer, então os empreendedores vão criar
lobbys para impedir que a margem de lucros diminua; todos vão impor
um regime de redução de custos extremo. Reparem que é esse sistema
brutal que Kogos defende ao mesmo tempo que alega que tais atividades
permitiriam ao sujeito poupar para abrir seu próprio negócio! Num
quandro de redução brutal de custos e pagamentos irrisórios por
entrega onde o empregado é obrigado a ampliar suas horas de labuta
para sobreviver falar de poupança – portanto num contexto de puro
sobrevivencialismo – chega a ser um escárnio. A realidade é que
Kogos tem uma função clara: legitimar o processo de Mamonismo, de
culto ao lucro desmedido e de rapinagem empresarial incluído aí a
sanha do capital global representado pela UBER – que já se vale de
processos técnicos que visam substituir de vez o homem pela
Inteligência Artificial num cenário de futuro fracamente distópico
- que tomou conta do país faz um tempo. Não há nenhuma
preocupação dele com o bem geral do país mas apenas com a defesa
intransigente das “trocas voluntárias”, noção mercadológica
aplicada a tudo, até a relações de trabalho que deveriam estar sob
a regência duma ética, sem considerar a disparidade de poder que
envolvem as mesmas e os consequentes abusos empresariais quando falta
a proteção duma autoridade/poder/lei que modere a cupidez do pólo
do capital.
Outrossim
é uma piada de mau gosto Kogos chamar tudo isto de empreendedorismo.
Isso não é empreendedorismo. Empreendedor é aquele que cria seu
próprio trabalho e isso se dá quando ele identifica que há um
nicho de mercado que não está sendo atendido e ele vê que o risco
de criar um negócio vale a pena. Ele calcula que entre o grau de
risco e aquele emprego conservador dele com salário certo, que vale
a pena arriscar, que correr o risco é uma alternativa melhor e mais
promissora se ele tem as condições mínimas para atender aquele
nicho. A primeira coisa que determina o empreendimento é não a
falta de possibilidades mas a presença delas, pois isso permite
calcular riscos e tomar riscos. Quem trabalha com UBER e entrega não
tem possibilidades, ou seja, está trabalhando ali pois é o que tem
então não há opções. O empreendedorismo, via de regra, acontece
em cenário de prosperidade e crescimento econômico e não de
depressão pois ele depende do empreendedor identificar uma demanda
não atendida e tentar atendê-la mas agora vivemos um cenário de
depressão e falta de demanda pois não há novos desejos de
consumo.; a demanda está estável, não há nenhum novo mercado
surgindo.
Aliás
Kogos desconhece a própria escola austríaca pois nela temos o
conceito de Bawerk que seria o de circularidade ou produção
indireta; este conceito implica em que quando temos taxas de juros
mais baixas há um favorecimento a produção indireta pois
geralmente produtos industrializados – que são feitos por etapas -
demandam grande capital; num cenário de prosperidade econômica os
bancos estão mais propensos a conceder crédito, nos de recessão os
bancos jogam as taxas lá em cima de modo que os tipos de
empreendimento que surgem nas fases de crescimento são de qualidade
superior aos que surgem nos de período recessivo. Pensemos num
cenário de milagre econômico a 12 por cento de crescimento por ano
onde um sujeito quer criar uma fábrica de calculadora que vai exigir
algum capital mas não tanto quanto para fazer um smartphone que
exige mais tecnologia. Nesse cenário o banco vai liberar esse
crédito pois há confiança; num outro cenário – recessivo - o
banco não vai liberar crédito e se liberar talvez não seja
vantajoso levar a produção de calculadoras a cabo pois a margem de
lucro será muito baixa em face as taxas de juros que estarão altas.
Suponhamos que o Brasil comece a vender minério de ferro a todo
vapor para EUA e China; o que ia acontecer é que esses subempregos (
uberistas, entregadores, etc) iam murchar para dar lugar aos empregos
formais pois os reajustes de salários tornarão esses empregos mais
vistosos somados a segurança jurídica que oferecem; os empregos
informais certamente vão oferecer ganhos mais altos em razão da
produtividade geral da economia mas não a ponto de roubar os
empregos formais; então há, para sermos aristotélicos, o bom e o
mau empreendimento e a tendência é que os melhores empreendimentos
nasçam na passagem da fase de recessão para a de crescimento e que
os empreendimentos nascidos na fase recessiva desapareçam em face
aos maiores ganhos fornecidos pelos empregos formais. Se há uma
elevação qualitativa dos padrões de empregos a tendência é que
esses empregos mais sofisticados acabassem superando em muito o ganho
dos empregos informais. Logo o segredo da produtividade não está
numa mera liberalização no setor de serviços como imagina Kogos
mas está na dependência da produtividade geral do país o que passa
por mudanças nas estruturas produtivas e no estímulo a demanda.
Créditos ao contributo do amigo Arthur Rizzi.
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