terça-feira, 28 de maio de 2019

9 razões por que Ernesto Araújo é um inepto que não conhece história

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O fenômeno do imbecil coletivo - antes restrito a esquerda - agora toma também a direita. E o pior: se encarna até em personagens que, pela sua condição profissional, deviam prezar pela inteligência aguçada dos fatos e das coisas. Falo aqui no sr. Ministro das relações exteriores e aluno de Olavo de carvalho, Ernesto Araújo. 

Recentemente Araújo lançou um artigo em seu blog "Metapolitica", aproximando - como é de costume na esfera olavética - marxismo e nazismo numa tentativa espúria de santificar a direita. Sim o objetivo é esse: canonizar a direita liberal-conservadora como a única via possível, decente, digna, moral. Aqui o objetivo não é discutir, agora, se nazismo e marxismo prestam. Na verdade esta tendência a abordar as ideologias primariamente por um crivo maniqueísta - é bom ou mau? - beira a infantilidade. Sou professor e costumo receber perguntas deste tipo quando leciono sobre guerras e revoluções, coisa absolutamente compreensível para mentes inexpertas e que ainda não entendem que o mundo é mais "cinzento" que "preto no branco".  O que não é compreensível é que alguém que se considera um intelectual se comporte da mesma maneira. Um aluno a gente perdoa, um diplomata não. 


Não vamos nos ater a refutar ponto a ponto mas a fazer alguns apontamentos gerais que derrubam os pés de barro das alegações de Ernesto. 

Primeiro que fique claro: aliança liberal - conservadora é a bola quadrada. Uma impossibilidade lógica fácil de compreender. Chegamos aqui a pensar que o sr. Araújo fosse razoavelmente inteligente, quando, tempos atrás, nos deparamos com alguns artigos seus, mas foi um rotundo engano. O sr. Araújo pensa que é alguém livre de ideologia mas não é. O sr. Araújo é alguém que reconta a história conforme a conveniência política da hora. 

Sobre a questão de o nazismo ser de esquerda ou não, o sr. Araújo ignora, por exemplo, que:

1- Se Hitler e o NSDAP eram de esquerda, por que Otto Strasser saiu do partido nazi e fundou o Partido Nacional-Socialista revolucionário e que postulava a luta de classes?

2-Por que Hitler fez acordos com os barões da indústria alemã assegurando-lhes a propriedade privada dos meios de produção caso viesse a governar um dia, desagradando a ala strasserista do NSDAP? 

3-Sim o nazismo era anticapitalista mas por que era contra o "capitalismo internacional" e não por que fosse defensor da coletivização dos meios de produção. Como bem mostra o historiador Tyrrel:

 "Hitler entendia que a terra era destinada à coletividade do povo mas o que se produz nela com o talento individual era de posse privada". 

Isso coloca o nazismo na condição de  "terceira posição nacional" e não de esquerda ou direita.  É comum nos meios direitistas e esquerdistas do Brasil reduzir tudo a estas duas categorias. Todavia "esquerda" e "direita", são conceitos cambiantes e relativos e não ajudam muito a entender a realidade múltipla da política. O PT é de direita em face ao PSTU e de esquerda em face ao PSDB. Logo, para entender uma doutrina política não podemos nos valer tão só desta categoria relativística, mas sobretudo duma análise acurada da substância das doutrinas em tela. Por exemplo: tanto o bolchevismo quanto o nazismo falavam de um "novo homem". A uma mente superficial isso pode parecer equivalência mas sabemos que não é. O cristianismo também fala do "novo homem", nem por isso pode ser classificado como irmão do nazismo ou do bolchevismo. O novo homem soviético e o novo homem nazista são tão distantes que jamais se encontram a não ser para se digladiar: não há a mínima chance de conexão ou simbiose aí. Estar a direita, no século 19, era ser contra a igualdade de todos perante a lei. Já hoje o direitista padrão defende a igualdade perante a lei contra as políticas afirmativas da esquerda que postulam privilégios legais para grupos marginalizados. Essa atitude de classificar tudo em termos de direita/esquerda está no plano da sub-intelectualidade e de um método que se baseia apenas na aparência das coisas. Foi Platão quem disse que as aparências eram enganosas e ele tem toda a razão. Sofista é justamente aquele que, não conseguindo ir além das aparências para subir ao céu das idéias, se fixa na doxa produzindo um conceito enganoso da realidade. O sr. Araújo é um sofista. 

4- Foi o nazismo quem lutou contra a URSS e não os EUA. Quem fez acordo com o comunismo em Yalta e Teerã dividindo o mundo com o bolchevismo foram os EUA e a Inglaterra capitalista, países de tradição liberal, e não a Alemanha nazista. 

5- No Mein Kampf, Hitler deixa claro que seu objetivo principal consistia em destroçar a URSS e o bolchevismo. Seu intento não era atacar a Europa Ocidental mas a Rússia. As coisas mudaram em 1939 por que a Inglaterra declarou guerra a Alemanha, obrigando o III Reich a abrir dois fronts na década de 40. 

6- A União Soviética não foi a primeira a tentar um acordo com o Terceiro Reich, mas a última. A Liga das Nações, formada majoritariamente por países capitalistas, antes mesmo do Pacto nazi-soviético - meramente tático, coisa evidenciada pela Operação Barbarossa - já havia concedido a Hitler o direito aos Sudetos e Áustria. Forçar uma proximidade ideológica entre URSS e Terceiro Reich é pura ignorância de fatos que deveriam ser comezinhos para um diplomata. 

7-  Se analisarmos as grandes crises históricas, notaremos que todas elas terminaram por provocar uma concentração do poder nas mãos de um líder mais ou menos autocrático: a Primeira Revolução inglesa desaguou no poder pessoal de Cromwell; a Revolução Francesa, naquele de Robespierre e, sobretudo, anos depois, no de Napoleão; o resultado da revolução dos escravos negros de Santo Domingo foi a ditadura militar, primeiro, de Toussaint Louverture, e mais tarde de Dessalines; a Revolução Liberal na França de 1848 levou ao poder pessoal de Luís Bonaparte ou Napoleão III. A categoria de totalitarismo para dizer que "nazismo é de esquerda"  pode servir, no máximo, à análise comparada das formas práticas de governo a que se recorrem em situações de crise mais ou menos agudas mas nunca para determinar substâncias. Assim, se nos esquecemos do caráter formal dessa categoria e a absolutizarmos, corremos o risco de constituir uma família de irmãos gêmeos demasiadamente numerosa e heterogênea. No que se refere ao período entre as duas grandes guerras mundiais do século XX, são inúmeras as crises que culminaram na instauração de uma ditadura pessoal. De fato, uma análise mais atenta permite observar que esse é que vai ser o destino de quase todos os países da Europa continental e do Hemisfério Norte Ocidental. Os únicos que ficaram fora disto foram os dois países de origem anglo-saxã: EUA  e Inglaterra. Mas inclusive esses países, a despeito de terem atrás de si uma sólida tradição liberal e de gozarem de uma situação geográfica e geopolítica particularmente favorável, viram a manifestação da tendência à personalização do poder, à acentuação do poder executivo sobre o legislativo, à restrição do rule of law: nos Estados Unidos, bastou uma ordem de F. D. Roosevelt para que os cidadãos estadunidenses de origem japonesa fossem presos num campo de concentração. Quer dizer, a análise das práticas de governo, na qual se funda a categoria de totalitarismo, acaba atacando, ou ao menos roçando, até mesmo os mais insuspeitos países. Isso demonstra, por a mais b, que o sr. Araújo não sabe do que fala. 

8-  A junção URSS - EUA durante a Segunda Guerra Mundial não foi mera necessidade da hora contra um inimigo em comum mas um consórcio possível graças a identidade ideológica entre os dois sistemas. Em 23 de julho de 1944, Alcide De Gasperi, que se preparava para ser o presidente do Conselho na Itália livre do Fascismo, pronunciou um discurso em que afirmava enfaticamente: " Hitler e Mussolini... inventavam aquela pavorosa legislação antijudaica que conhecemos...porém ao mesmo tempo vejo o povo russo, composto por 160 raças, buscar sua fusão, superando a diversidade existente entre a Ásia e a Europa, essa tentativa, esse esforço pela unificação do consórcio humano". As palavras de De Gasperi são bem significativas: mostram que o ideal soviético era o da cosmópolis; o mesmo ideário se encontra nos EUA com sua religião da liberdade universal. O que é interessante é observar que o sr. Araújo, ao mesmo tempo que se diz anti-globalista, aposta justamente numa leitura globalista da história em que exalta o modelo da cosmópolis estadunidense.

A antítese ao esforço nazi-fascista em defesa da supremacia da Europa era não só o universalismo da democracia americana em sua raiz liberal, onde todos os indivíduos são iguais perante a lei independente de seu valor pessoal, ideologia que justificava o anticolonialismo europeu mas também o bolchevismo da URSS na qual a herança européia vinha sendo contestada e destruída desde 1917. O principal inimigo da Europa, a quem Hitler desejava defender, era a União Soviética, que incitava a revolta dos povos (URSS que nada mais era que a expressão da vontade judaica revolucionária de um imperium utopista) contra o senhorio da Europa e de sua cultura tradicional. A partir da ascensão dos bolcheviques ao poder – escrevia Oswald Spengler –, a Rússia retirou a “máscara branca” para se tornar “de novo uma grande potência asiática, mongol, animada pelo ódio contra a humanidade branca. Logo não havia nada de comum, essencialmente falando, entre nazismo e a esquerda bolchevique. A referência ao fato de que nazismo e comunismo ambos "destroem as estruturas tradicionais da sociedade" vale até para o liberalismo que Araújo apoia, dado que, por onde passou, destruiu as antigas corporações e poderes intermediários. Será que o liberalismo é de esquerda também? O que Araújo usa para identificar esquerda e nazismo são aspectos acidentais. Mas aliás, que estruturas tradicionais o nazismo destruiu que já não estivessem destruídas pelo capitalismo liberal, desde o século 19? A afirmação de Araújo é completamente demencial. Se na Rússia o bolchevismo destruiu a antiga sociedade feudal que ainda restava de pé no campo, o nazismo encontra a Alemanha já na era industrial de massas, onde as antigas hierarquias já haviam desaparecido. O que restava delas, precariamente, era o baronato descendente dos junkers prussianos, justamente com quem Hitler atrelou-se. Falta à análise de Ernesto - é até bondade chamar o artigo em tela de análise, que fique bem claro -  uma avaliação séria sobre as doutrinas nazistas e o bolchevismo, talvez por que Araújo não tenha a profundidade intelectual para fazê-la, preferindo repetir um lugar comum da olavosfera, o que lhe coloca na condição, não de um intelectual sério em busca da verdade mas na de um retórico interessado nos aplausos da platéia cativa: ou seja, na de um sofista.  

9- Em suma: EUA/URSS representavam, por suas ideologias de fundo, um cosmopolitismo, quer dizer, repreentavam a idéia de unidade do mundo através da igualdade e liberdade comum a todos os homens. A Alemanha postulava outra coisa: a supremacia da Europa contra a barbárie da massificação liberal/igualitária típica da sociedade pós 1789, ainda que se possa discordar do caminho por ela escolhido em 1933 quando da ascensão do nazismo, o fato inegável é que ela é quem significa, verdadeiramente, uma viragem anticosmopolita. E é essa barbárie significada por EUA/URSS a mesma que está levando-nos ao globalismo, o qual Araújo diz que combate apesar de lhe fazer coro quando defende o ethos americano.