sexta-feira, 21 de abril de 2023

O "Cristo Marxismo" de Daniel Ortega

 


Embora a concordata entre o estado venezuelano e a Santa Sé – firmada em 1964 – continue vigente desde Chavez surgiram elementos de profunda tensão entre as autoridades eclesiásticas e a políticas da Venezuela logo no começo do regime. O caso da Igreja Nicaraguense tem similaridades com o status do clero católico na Venezuela que desde a ascensão do chavismo é de conflito ainda que o regime tenha se apropriado das pautas morais cristãs como criminalização do aborto e dos estudos de gênero e deixado de lado o invasionismo do estado na tocante a pautas lgbtqi+.


Quanto a Nicarágua cabe dizer que o monsenhor Carlos Enrique Herrera, presidente da CEN (Conferência Episcopal da Nicarágua), confirmou que a Polícia determinou que as procissões de Semana Santa fossem realizadas apenas nos templos o que indica que a religião católica está a virar religio ilicita no país. A Via Sacra aquática feita a mais de 40 anos no grande lago Cocibolca que é, além duma tradição religiosa um evento turístico que ajuda a economia local e os barqueiros, acabou sendo feita pelo regime de Ortega decidiu conduzir a Via Sacra no lago mas sem um padre para rezar e conduzir as 14 meditações nas respectivas estações o que além de tudo indica que o regime poderia estar indo na direção da formação duma igreja nacional a reboque do estado.


Igualmente na Venezuela a Igreja, especialmente o episcopado, foi tratada com cautela pelo Movimento da Quinta República (MVR) durante sua subida ao poder. A relevância social da Igreja no sistema politico e as críticas pessoais de alguns bispos a candidatura de Chavéz em 2002 criaram desde cedo situações de atrito. Embora não houvesse consenso entre leigos, padres e bispos em torno duma visão de país e seu regime político era percebido que o chavismo na medida que buscava hegemonizar os interesses e recursos da sociedade civil, não poderia ser positivo dada a relativa dependência da obras pias e institutos religiosos dos subsídios estatais assim como o desastre que economia chavista impunha ao setor privado acabava refletindo na diminuição da colaboração deste a Igreja. O chavismo mesmo tendo absorvido o moralismo católico popular sempre foi carregado de anticlericalismo e ambivalente face à religiosidade popular. Isto deve-se ao marxismo crioulo em relação ao estabelecimento formal do clero onde o mesmo estaria separado dos paroquianos por uma opção preferencial pelos ricos. A verdadeira doutrina salvífica estaria na revolução bolivariana: o chamado Cristo – Marxismo do MVR.


Ortega fez uma relação similar contra a hierarquia católica acusando-a de ser uma ditadura perfeita por seus membros não serem elegíveis. Fundamentada na clássica dicotomia “povo vs oligarquia” a reação chavista implicava numa releitura da teologia da libertação explicitada num discurso de Chavez sobre as missões coloniais ao dizer que “católicos imorais espalharam histórias pela América para legitimar a escravidão ao falarem que Deus quis que fossem escravos para atingir a redenção no céu mas o Reino de Deus está aqui na Terra” (In: Venezuela, Chavismo e Iglesia Católica, p.14). Dada a missão da qual o Chavismo se investiu a hierarquia católica foi associada como aliada da opressão e inimiga dos setores historicamente explorados caracterizando o catolicismo venezuelano como irremediavelmente dividido entre bispos agentes da alienação e clérigos regulares ligados as lutas pela liberação popular. Ao que tudo indica Ortega está calcado nos mesmos ideais e decidido a revolucionar o catolicismo nicaraguense na direção do Cristo – Marxismo.


Adapatado do texto de Lucas Dias Aguiar.