Olhem o simbolismo ("ad dexteram") e tirem vossas conclusões. |
O
primeiro passo em direção a uma ação condizente para
livrar o Brasil do risco que está a correr
é entender o que se passa. Não há a mínima chance de
abrir uma via legítima de resistência ao governo Bolsonaro que
seja, ao mesmo tempo, uma via alternativa para a reconstrução da
nação, sem a compreensão da lógica que o caracteriza e
do perigo que nos ameaça agora.
O
governo Bolsonaro é um compósito de cinco alas: militares,
protestantes, lavajatistas, olavistas, liberais. Cada uma delas tem
propósitos e valores diversos o que torna o governo altamente
instável por si só. Desde o começo dele ficou claro que estas
facções iriam se digladiar pela hegemonia. Cabe lembrar da luta que
elas travaram por ministérios antes da posse presidencial e como os
militares saíram em franca vantagem no início. Um setor do
generalato unido em torno de Bolsonaro, conhecendo bem os caminhos do
poder e as tramas do establishment, conseguiu uma boa quantidade de
cargos e ministérios, garantindo um importante espaço com 46
militares em posições estratégicas. Mas o embate dalguns milicos –
como Mourão e outros que puseram barreira às pretensões
israelófilas de transferência de embaixada para Jerusalém assim
como aos arroubos de intervenção militar na Venezuela - com as
pretensões da ala olavista – comprometida com os interesses de
Israel/EUA e encalacrada no ministério do exterior quanto no da
educação e contando com o apoio de Eduardo e Carlos, filhos de
Bolsonaro, que tem um peso grande dentro da condução do governo –
acabou trazendo a demissão dos generais Santos Cruz, Juarez Cunha e
Franklimberg Ribeiro, numa clara vitória de Olavo de Carvalho pela
hegemonia ideológica sobre o presidente. No começo do ano dissemos
que o objetivo de Carvalho era radicalizar a direita aglutinando-a em
torno de si sob a alegação de que o governo estaria repleto de
“aparelhamento socialista”. A ameaça do “comunismo petista”
passou a funcionar como uma “palavra talismã” capaz de suscitar
o medo e a mobilização em prol do governo, numa defesa
intransigente dele, a ponto de caracterizar possíveis desvios do
mesmo em face as promessas de campanha ou dos princípios que
legitimaram a subida de Bolsonaro ao poder como produtos de “agentes
infiltrados” no governo e não como fruto da inépcia ou da
conveniência. Cabe dizer que os postulados que sustentaram a
candidatura Bolsonaro eram os da moralização da máquina pública,
tecnicidade do estado, império da lei, eliminação dos conchavos e
do “toma lá dá cá”, liberação de armas, combate ao crime,
valores religiosos, anticomunismo, estado mínimo, etc, postulados
estes que em sua maioria foram sendo deixados de lado, seja sob a pressão de limites
reais, seja pela falta de compromisso real com estes temas, usados na eleição
apenas como instrumentos de demagogia. Assim a moralização do
Estado deu lugar ao filhotismo político – com a indicação de
Eduardo para embaixador nos USA - e a admissão de notórios
corruptos vinculados a velha política dentro da base aliada do
governo e nalguns ministérios – caso de Onyx Lorenzoni – o
império da lei deu lugar a política da conveniência no caso
Queiroz/Flávio Bolsonaro, o toma lá dá cá voltou para passar a
nefasta reforma da previdência – que penaliza os trabalhadores com
mais tempo de contribuição para o Estado em troca de aposentadorias
com valores menores no benefício final – a idéia de armamentismo
deu lugar a um decreto pouco incisivo neste sentido, o combate ao
crime, via proposta de lei de Moro, está na gaveta, os valores
religiosos e morais só existem no discurso dado que o governo está
mais empenhado nas reformas econômicas liberais, etc. O que restou
de todo blá blá blá eleitoral foi o apoio cego de setores protestantes – que veem o
presidente como um “enviado divino" - dos setores do liberalismo econômico
que ainda apostam nas reformas, apesar da falta de habilidade de
Bolsonaro em negociar com o congresso, e do olavismo militante cada
vez mais fanático e empenhado em salvar um governo que naufraga a
olhos vistos, incapaz de gerar crescimento, emprego e renda e de
cumprir boa parte de suas pautas além de cada vez mais isolado de
suas apoiadores de primeira hora e de suas promessas originárias. Boa parte da direita – aquela
mais liberaldemocrática e centrista – já deixou o governo.
Deputados do PSL – agora dividido entre a ala próLava Toga e
AntiLavaToga – já ensaiam uma cisão e a formação doutra sigla o
que prenuncia que a ala lavajatista deverá ser ripada do governo
como fora, em parte, a ala militar. O exército, dando sinais de
descontentamento, já faz movimentos em clara provocação ao governo
como a recente promoção do general exchefe da segurança
presidencial de Dilma Roussef somado ao fato de o general Otávio do
Rego, porta-voz presidencial, ter sido preterido à indicação da
quarta estrela o que fará o mesmo encaminhar-se para a reserva.
Perante
tudo isto Olavo se colocou na vanguarda da defesa do governo
lançando-se de vez como ideólogo-mor dele. Nos seus últimos
vídeos, já prevendo a crise iminente entre setores próLavaJato,
que defendem o combate a corrupção em geral, e as necessidades de
sobrevivência do governo Bolsonaro – que envolvem o arquivamento
das investigações sobre o Senador Flávio Bolsonaro, que poderiam
resvalar no presidente, abrindo brechas para a queda do governo – o
velho abriu fogo e lançou críticas ao lavajatismo acusando-o de descolar o
combate à corrupção do combate ideológico ao PT. Para Carvalho o
fato da LavaJato realizar-se sob os auspícios da neutralidade da lei
impossibilita um combate eficaz ao petismo – razão de ser máxima
do governo Bolsonaro, para o astrólogo – que, no fim das contas,
seria a única coisa que de fato interessaria. Isto tudo permite
dizer que, pouco a pouco, Olavo vai atingindo seus fins, quais sejam
o de alcançar a hegemonia ideológica sobre a direita bolsonarista
reaglutinando-a em torno do combate ao “fantasma petista” - a
tal palavra talismã – apresentado-se como o único que tem o
conhecimento efetivo para dar cabo de tal ameaça.
A
idéia força de Carvalho é a renúncia a valores e princípios para
uma defesa intransigente e pragmática do “Chefe”. Nem
conservadorismo, nem combate a corrupção, etc, nada do que foi
prometido durante as eleições importam agora mas, tão só, impedir
que “O PT volte” e que o “Chefe” caia. O pressuposto do velho
astromante é que politica se faz com luta pelo poder entre grupos
opostos e não com idéias abtratas ou princípios gerais, ao mesmo
tempo que se vale de idéias abstratas rasas – anticomunismo vago –
para separar e distinguir sua facção das outras, ao mesmo tempo que
aglutina os eleitores bolsonaristas perplexos com as recorrentes
crises debeladas pelo governo, em torno dum princípio geral – o combate
ao “petismo” (que, no linguajar olavista, significa tudo que não condiz com a narrativa do velho da Virgínia) – evitando, assim, sua dispersão.
Como a facção olavista é a única que possui um intelectual como
timoneiro de suas ações, a única que tem uma ampla rede de blogs,
sites e canais capazes de ecoar uma narrativa política que atue no
plano do sentimento popular, qual seja a raiva anti-petista que tomou conta
do país - “quem defende lava toga ajuda o petismo pois cria
instabilidade”, "MBL é comunista", etc - a única que tem “intelectuais” orgânicos
atuando para formatar a opinião do eleitorado bolsonarista, ela
acabará engolindo de vez as demais se nada for feito. Importa dizer
que a facção olavista adotou um Gramscismo de Direita: eles são o
Partido do Brasil. Eles são a encarnação da vontade do povo. Olavo é o
Robespierre da Direita. Seus blogueiros e youtubers são seus
Jacobinos a guilhotinar, ideologicamente, os divergentes. É bem
verdade que os liberais ao estilo Guedes, tem seus thinks thanks,
seus círculos e seus intelectuais orgânicos, contudo eles estão
pouco interessados em impedir a ascensão do círculo olavista, a não
ser que ele se engaje num anti-reformismo liberal – coisa
absolutamente improvável pois, por anos a fio, Olavo foi um dos
grandes divulgadores da escola austríaca de economia. O cenário é
de completa deterioração da vida política brasileira e do estado
nacional, prestes a ser capturado, mais uma vez, por um Partido, como
já fora sequestrado na era PT, pelo esquerdismo militante tresloucado e facínora.
A ala olavete não medirá esforços para tanto. Seu Gramscismo de
Direita levará inevitavelmente ao mais atroz imoralismo e
maquiavelismo, destruindo de vez a malha ética necessária para um
vida política minimamente razoável no país - cometendo os mesmos pecados que consagraram as ações do PT uma vez no poder - abrindo caminho, quem
sabe, para um conflito sem fim e a consequente divisão definitiva do
Brasil em facções inconciliáveis o que exigirá, como mostra a
história, uma ditadura para assegurar a governabilidade – aí se
encaixam as recentes declarações de Carlos Bolsonaro em torno da
necessidade de fechar o congresso para que o
presidente governe em paz. Este imoralismo e maquiavelismo fica
evidente nas viradas repentinas de discurso – antes o STF era
inimigo público número um pois recheado de juízes a reboque do
petismo, agora é preciso governar sem irritá-lo, o inimigo real é
o Foro de SP e não os juízes, etc – e nas composições de
conveniência – como no caso da omissão do presidente em vetar a
iniciativa do STF de equiparar racismo a homofobia, indo contra seu eleitorado religioso e conservador. Cabe dizer que
Gramsci era um leitor dedicado de Maquiavel e que, para o escritor
florentino, a política não pode ser fundada nos preceitos da moral
ou da religião. Num amplo parágrafo dos seus Cadernos, Gramsci
reflete sobre isto nestes termos: “Um conflito é ‘imoral’
quando torna o fim mais distante ou não cria condições que tornem
o fim mais próximo (ou seja, não cria meios mais adequados à
conquista do fim)...Desse modo, não se pode julgar o político por
ser ele honesto ou não...Ele é julgado não pelo fato de atuar com
equidade, mas pelo fato de obter ou não resultados positivos...”.
Todos os conflitos que servirem ao fim de olavetizar de vez o governo
– o que significa torná-lo um instrumento dum regime de força a
serviço do direitismo – serão estimulados e promovidos. Portanto,
a estratégia gramsciana agora incorporada pela facção olavete vai
delinear a ação política em torno de dois métodos, quais sejam, o da violência e do consenso:
acusação sistemático de petismo/comunismo contra quem apoiar a LavaToga,
divergir duma vírgula, etc, e caça às bruxas (a criação duma
lista de inscrição para a formação da militância bolsonarista
sob a chefia de Allan dos Santos do Terça Livre e a abertura da
gratuidade do COF do senhor Carvalho para policiais militares envolve
este objetivo, qual seja, forjar uma malta de fanáticos e uma força
paramilitar que possa ser mobilizada contra os adversários usando
até mesmo a força e o recurso ao assassinato) associada a
construção duma narrativa – “estamos impedindo a volta do PT e
limpando o Brasil, quem discorda é inimigo do povo, etc”.
Perante
tudo isto que expomos ou há uma tomada de consciência sobre o
problema que se avizinha ou a nação será engolida pelo vórtice do
jacobinismo olavista.